Antonio de Albuquerque
1984
Buscando a Luz (1)
Caminhava
por fétidas galerias num ambiente estreito, tortuoso e escuro. A visão era ruim
e não sabia onde pisava, tendo a sensação que cairia num despenhadeiro. Sem
ventilação sentia dificuldade para respirar e tinha pensamentos vagos e
abstratos. Não me lembrava da minha origem nem destino, sem noção de tempo, poderia
estar ali há um dia ou a uma eternidade. A solidão e o pavor me acompanhavam. Sem
entender, estava perdido num abismo sem perspectiva de encontrar a saída. Não lembrava
ser uma pessoa e estava oculto numa completa escuridão física e mental, e não
me situava no espaço e tempo. Sem lembrança do passado, não entendia o presente
ou futuro. Mergulhado no esquecimento tinha apenas uma vaga lembrança da
realidade. Muito tempo depois, no alto enxerguei uma luz clareando o espaço
infinito, embora entre mim e essa luz houvesse imensa distância, me senti
confortado enxergando além da nebulosa escuridão. Com o passar do tempo visualizei
o céu atapetado de astros e estrelas, e observando esse santuário pude ver uma
luz maior no alto. Para mim era apenas uma luz, por não lembrar seu nome, mas
me agradou e fiquei espiando seu movimento. Depois me lembrei de que a luz vista
era o Sol. Creio que em mim surgiu à lembrança naquele instante, visto que sua
ausência me atormentava. Com o Sol nasceu o dia e a claridade, e não mais senti
medo das trevas. Foi esta a primeira manhã que eu vi nascer, alegre e risonha,
com intensa luminosidade. Na claridade do dia descobri a vegetação, que sobre
ela a luz do Sol se espargia dourando suas folhas. Caminhando pelo lugar, senti nos pés a areia macia, e na margem a
relva cobrindo à terra molhada. A diversidade das plantas me alegrava e tudo em volta me encantava, estava
aprendendo a amar a natureza rica e bela. Aos poucos descobri a razão da minha existência,
tal qual, a Luz, a água e a vegetação. Suavemente o vento tocava meu rosto, e
mesmo sem conhecer sua origem me
contentava, mas indagava para mim mesmo:
Quem eu sou? De onde eu vim e para onde vou? E que lugar seria aquele? Dessa
forma senti a necessidade de pensar e racionalizar, sendo esse um atributo que
me aflorava na memória.
O
Sol declinava deitando sua luz dourada no ocidente, outro fenômeno que eu desconhecia.
Assistia pela primeira vez o por do Sol, e o surgimento da noite. Num breve
momento enxerguei a formosa Lua, e seus movimentos. Agora podia contemplar as
belezas da natureza; o céu, os astros, o Sol, e a Lua dominando a Terra e prateando
o mar, a água correndo nos regatos e os animais passeando nos prados, nos
campos, e nas lindas e risonhas manhãs. Havia encontrado a felicidade que seu
esplendor, a alegria me ofertara. Mas precisava conhecer o arquiteto que havia construído
essa Divina obra universal. Numa alegre manhã com o Sol dourando o amanhecer acordei
ouvindo o trilar dos passarinhos, o sussurro da água rolando no ribeiro e
árvores enfeitadas de flores e frutos formando um indelével santuário. Olhando
para o alto vi o Sol nascer pela segunda vez. Permaneci nesse lugar por um
longo tempo procurando entender a natureza, percebendo os sentidos, e as
formas, construindo um profundo sentimento de amor pela fauna e a flora. Passeava
pelas florestas, pelas águas, santuários e por distantes lugares, mas ainda havia
uma questão que não entendia; a razão da minha existência. Resolvi então,
empreender uma longa viagem. Após uma extensa caminhada por mares, rios, florestas
montanhas, e diferentes lugares, vendo diversas
vezes o amanhecer e o entardecer, havia encontrado um lugar diferente de todos
que havia conhecido. Um espaço que me fez parar e refletir sobre o pouco que
recordara das minhas passagens pela Terra; minha origem, meu destino. A razão
de estar naquele ambiente aflorou minha memória. Nesse lugar encontrei uma
casa, hesitei ao aproximar-me, mas depois de algum tempo cheguei bem perto e
ouvi um agradável som musical que me trouxe um turbilhão de pensamentos, lembranças
e recordações de lugares, pessoas,
línguas, ciências e também de ilusões, entre rosas e espinhos. A ciência me
conduziu à realidade, mas quanto às ilusões, suas lembranças e práticas me
fizeram sofrer, afinal eu estava na Terra. Lembrando-me do passado, entendi o
presente, marcado por sofrimentos, mas também por grandes venturas. Aproximei-me
da casa, ela era azul, com janelas amarelas e cortinas brancas e verdes de
renda que o brando vento esvoaçava pelo ar. Ali encontrei pessoas felizes, e ao
entrar sorrindo carinhosamente me
abraçaram. Um homem me recebeu dizendo que eles me esperavam há muito tempo, e que havia chegado o momento de
sermos felizes. Eu lembrei-me que já os conhecia e chorei de contentamento.
Num
ágape constante permaneci na casa por dias, convivendo com as pessoas que me
receberam e aguardando um grande
acontecimento que guardavam como surpresa para mim. Certo dia, todos se
apressaram para chegar à janela, queriam de perto ver o Homem que passava. Eu
também apressurei-me para ver seu sublime rosto. Os homens caminhavam em fila
indiana, um deles avançava à frente e os outros o seguiam. O Homem que vinha à
frente tinha uma beleza inarrável, e seu semblante transmitia paz e harmonia.
Vestia túnica branca, nos pés usava sandálias, e no coração trazia o amor e o perdão. Com um só olhar Seu, senti toda a
felicidade e alegria que eu merecia. Esse Homem é Jesus.