10.11.15.
Antonio de Albuquerque
Fragmentos do Livro – Gameleira -
Lembranças de menino
Dona aqui está à chave do quarto,
não mandaram o dinheiro e eu não poderei lhe pagar, porque se eu ficar só
aumentará a conta. ─ E a semana passada
quem paga? Vou trabalhar e voltarei para lhe pagar. Dona Inês sabia que não
iria receber. Fez um muxoxo dando as costas. Daí para frente o menino moraria
na rua. O menino caminhou cinco quilômetros até o centro da cidade, cinco que
pareciam cinquenta. Sentia-se fraco, precisava se alimentar coisa que não fazia
há dois dias. A esperança era encontrar alguém que lhe oferecesse alimento,
pois sentia vergonha de pedir. Tinha,
então, dez anos e havia descoberto que para enganar a fome, o melhor remédio seria
não pensar nela. Assim, em duas horas de caminhada chegou à Praça do Ferreira; seu
refúgio, onde passava o tempo sem olhar as horas no grande relógio da coluna central
da praça para não sentir as horas de fome, por serem muito longas. O menino procurava
postar-se de costas para o relógio que certamente, ainda hoje, lá se encontra. Não
olhava os ponteiros do grande relógio, mas ouvia suas badaladas que o faziam lembrar-se
da necessidade de alimento, amor e carinho. Então bebia água e sonhava com sua
família, que por necessidade o abandonara. Sem entender o que o mundo lhe
impusera, rezava uma oração, única, que sua amada mãe havia lhe ensinado; Pai
nosso que estás nos céus... A tarde se esvaiu no relógio do tempo e a noite
mansamente se apresou mostrando no céu as estrelas e o clarão da lua. O menino,
ainda, acordado observava as pessoas passarem indiferentes à sua expectativa,
mas mantinha a esperança de encontrar-se com a solução para sua vida e
apressou-se a pensar, e dormiu.
Duas badaladas. Novamente o relógio
acordou o menino. Um homem simples, com semblante calmo, sereno e de fulgurante
beleza, estendeu-lhe a mão, na outra conduzia um saco de papel com dois pães
lhe ofertando. O menino sentiu o cheiro, parecendo ser um manjar dos deuses e
com alegria incontida, sorrindo, aceitou, e em segundos havia comido o
delicioso pão. A fome passou! Disse o menino. ─ Quem é você? Perguntou. Sou
alguém que também mora na rua. Tranquilize-se, nem todos nascem reis, se todos
nascessem reis, quem seriam os súditos?Você, porém, um dia será um sábio homem.
E quando realizar seus sonhos lembre-se do que eu lhe falei. Sim meu bom amigo,
me lembrarei. Disse, ainda, o bom homem,
quando falo às pessoas elas nem me olham, mas quando me pedem alguma coisa eu
as atendo, seja um pão, ou até mesmo um conselho. Agora, olhe o céu, as
estrelas, fale com elas, peça alguma coisa, um dia você será uma delas. Sim,
falarei; Então, o menino falou; estrela dê ao meu amigo velinho muitos pães
para que ele possa distribuir com quem precisa mais do que eu, pois não mais
sinto fome. O menino dormiu. O relógio badalou, o menino acordou, sem fome, sem
medo, chamou o homem, mas não o encontrando, exclamou, nem sei o seu nome! Mas,
o chamarei de estrela.
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